quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

D. Joaquina do Pompéu

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Raríssima fotografia tirada em 1945 por Dona Raquel Mascarenhas Viana, mostrando o cemitério do Pompéu e ao fundo o belo solar de Dona Joaquina do Pompéu.

O cemitério dos brancos. “Tomé : quero construir a quatrocentos metros do lado esquerdo do casarão, um cemitério com uma Capela e uma cruz de aroeira para a minha família ( cemitério dos brancos ) . Do mesmo lado distante mil metros , um cemitério para os meus escravos ( cemitério dos negros ) , cercado com lascas de aroeira, bem fundo, para que os tatus não comam os meus negros depois de mortos, e uma cruz do mesmo tamanho da cruz do cemitério da minha família” In: Antônio Campos Guimarães, A Dama do Sertão, p.123.




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Há muitos anos, recebi de Maria Campos, professora e política em Dores do Indaiá, este presente maravilhoso: conjunto azul de taças de vinho em cristal com a garrafa, que pertenceram a Dona Joaquina do Pompéu. Uma relíquia que guardo com todo o carinho para sempre.



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                                       Solar do Pompéu. Foto de 1950, de autoria desconhecida. 



Joaquina Bernarda da Silva de Abreu Castelo Branco, conhecida como Joaquina do Pompéu, nasceu em Mariana (MG), no dia 20 de agosto de 1752, e faleceu a 14 de dezembro de 1824. 
Era filha de um advogado português, parente dos Condes de Valadares. Ficou famosa como grande latifundiária e administradora, conquistando enorme prestígio político. Transformou a Fazenda do Pompéu em uma grande propriedade. Suas terras abrangiam a região hoje compreendida pelos municípios de Pitangui, Paracatu, Abaeté e Dores do Indaiá.
Casada com o capitão Inácio de Oliveira Campos, teve 10 filhos. Pertenceram a sua linhagem, numerosas famílias dominantes na vida econômica, social e política do Estado de Minas Gerais. Dentre elas, encontram-se os Melo Franco, Benedito Valadares, Gustavo Capanema, José de Magalhães Pinto, Olegário Maciel e Ovídio de Abreu.



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Solar de D. Joaquina do Pompéu


Álvares da Silva

Já se disse tudo que se podia dizer e ainda é pouco – sobre as relíquias de Ouro Preto. As casas veneráveis, o tesouro dos templos, as pedras gastas pelo solado do sapato dos nossos antepassados, Ouro Preto inteira, desde as coisas grandes às pequenas, mas velhas e sugestivas, já suscitou exclamações de milhares de pessoas e já deu à literatura páginas admiráveis. Palavras de admiração já foram ditas aí em numerosas línguas. Sensibilidades cansadas e desiludidas dos centros cosmopolitas sentiram reanimar-se diante daquelas casas velhas e daquelas ruas antigas. O patrimônio de Ouro Preto é duplo: em pedra e ouro, em prosa e poesia. Orson Welles, “o mago do espetáculo”, gênio difuso e acostumado com as coisas gigantescas, banhado da vaidade de Hollywood e habituado à fama em Nova York, sentiu uma pressão no peito diante daquelas casas velhas e só poude (SIC) balbuciar uma palavra: “Estranho!...”
O caso é quase para rir-se, quando se lembra que ele é um “factotum” do cinema, artista, diretor, escritor de argumentos, intérprete laureado do “Júlio Cezar” de Shakespeare, locutor que alarmou os Estados Unidos e provocou pânico e morte, um milhão de coisas mais.
O gênio, o gênio americano, com a respiração oprimida diante de Ouro Preto! Era para rir... era para quase r...ir. Mas não! Não se pode dizer isto. Diz-se: ele
tem razão! Nada mais. Uma relíquia, seja um sobrado colonial ou apenas as
pedras de um gamão com duzentos anos, quase sempre aturde e mal dá a quem a admira o fôlego de dizer, um simples “Estranho!...” Assim é em Ouro Preto ou em qualquer outro lugar. Diante de um solar antigo – nem é preciso dizer-se antigo – muitos nem podem dizer uma palavra. O homem volta ao tempo em que ele foi construído, cheio de lembranças, sente num momento todo aquele tempo que passou. Cem... duzentos... trezentos anos! E fica mudo. O Solar de D. Joaquina do Pompéu tem perto de duzentos anos, é uma relíquia que está no oeste de Minas, e tem também essa presença estranha e saudosa que se sente nas casas veneráveis de Ouro Preto e Mariana. A dona dele nasceu em Mariana e construiu-o como se construiria em Ouro Preto para os séculos adiante. Parado diante dele, vendo-o, admirando-o, o que resiste ao tempo e também o que os anos escreveram nas suas paredes, fica-se silencioso, dominado pela sugestão, cheio de lembranças. Como é pequeno um homem moderno da era do cimento armado diante de um solar antigo! O homem é um minuto, a casa é dois séculos, veio das idades.
Naquelas paredes bateram o sol e as chuvas de dois séculos! Aquelas janelas e
aquelas portas se abriram pela primeira vez em 1700 e tantos...
Sim, aquelas janelas parecem portas de igrejas. São enormes. Aquelas portas parecem portas feitas para os muros de uma cidade medieval. Tudo é grande. Foram feitas, aquelas – vê-se bem – para que sobre elas passassem os grandes, e com eles as gerações, todo um patriarcado rural do oeste de Minas.

O solar de D. Joaquina do Pompéu foi construído num descampado: dele que se vê a léguas de distância, a vista se perde pelos chapadões azuis do oeste de Minas. É um sobrado. Domina a terra plana e aberta.

Hoje ainda, das suas janelas, pode-se olhar ao longe e pensar que a 1700 e
tantos, D. Joaquina do Pompéu queria ver os seus descendentes espalhar-se e
crescer em cem léguas ao redor! Das janelas altas ela via o futuro, os descendentes, os trinetos e pentanetos.
É curioso! Como é que o povo pode dizer que paredes como essas são de taipa! Taipa! Não! Isto é pedra! Como se disse muitas vezes, “os
antigos construíam em bases sólidas”. 
As paredes que construíam eram muralhas. Tão boas eram as suas paredes que até costumavam acrescentar-se ao nome do dono, como é o caso de Antônio Rodrigues Velho, descendente de bandeirantes ou ele mesmo bandeirante cognominado o “Velho da Taipa”.
O solar de D. Joaquina é uma relíquia que honra Pompéu. Não é apenas uma casa para ver-se, mas diante da qual é preciso rever a história mineira e percorrer os estudos de genealogia. Depois disso, conhece-se bem o solar e vê-se que ele é um monumento do Oeste de Minas.
Dele saíram gerações que povoaram e engrandeceram aquele pedaço de terra de Minas
– no sangue dos filhos de D. Joaquina do Pompéu já havia sangue dos
bandeirantes Fernão Dias e Anhanguera; também do famoso Tibiriçá, “pai da
metade do Brasil”; fundiam-se sangues de flamengos, Vanderburg e Beting, de
portugueses, espanhóis nativos. Os seus ascendentes diziam que eram “os
descobridores deste país”. Os seus descendentes povoaram o Oeste de Minas,
fundaram cidades, cooperaram na colonização, descobriram sertões, ajudaram o
Império e honraram a República. Foram guarda-mores, barões do Império,
conselheiros, chefes de governo, ministros, fazendeiros, industriais,
economistas, financistas, administradores, políticos e intelectuais. Cresceram
além das cem léguas em redor do sobrado, do solar que domina a terra ampla para além das janelas em que D. Joaquina de Pompéu via a terra e o futuro da sua gente. Ela deve estar satisfeita. O seu sangue era bom e vigoroso, espalhou-se por gerações que souberam e sabem honrar a sua memória.
Sim aquele sobrado de D. Joaquina Bernarda da Silva Abreu Castelo Branco Souto Maior é um capítulo expressivo da história de Minas. No oeste mineiro, quando alguém passa diante dele, para, olha-o, vê as suas janelas e portas enormes, repara nos estragos do tempo, nos hieróglifos que os anos escreveram nas paredes e diz: “Sim, Senhor! Os antigos construíram em bases sólidas! Esse solar tem quase duzentos anos!”

Depois acende um cigarro de palha, ritualmente e conta qualquer história de D. Joaquina do Pompéu.

“Bem, isso deve ter acontecido em fins de 1700, ali por perto de 1800... Não sei direito... Ela morreu em 1824, isto eu tenho a certeza! Bem, o caso foi assim...” E desfia a história. No fim, o ouvinte retruca: “Isto parece lenda! “O que está contando se encrespa (é descendente dela) e diz: “Eu sei! Eu sei! D. Joaquina é uma lenda! Tudo é lenda! Aquele sobrado ali daquele tamanho todo, é também uma lenda! Eu sou descendente dela! “Bate no peito: “Pentaneto, sabe? Com certeza sou lendário também, não é?!”
E volta a ficar calado e furioso, porque havia lido no livro do famoso repórter John Gunther “O Drama da América Latina”, editado em três línguas, que no Brasil ninguém sabe direito o nome dos seus avós...........................).
O velho casarão colonial de Pompéu, hoje reduzido à metade, pois que ruiu há tempos, um lance do tamanho equivalente aos que ainda existe, era, no tempo de D. Joaquina, o centro onde a gente fina do município fazia “rendez-vous”. Era um enorme sobrado senhorial, com a bagatela de grandes e espaçosos 79 quartos. E tudo muito bem mobilado. A ordem e asseio reinavam na casa.
Tudo era fino e distinto: panos de Damasco, da Bretanha, holandas finas, cambraias, linhos, candelabros de bronze, finíssimas louças japonesas, baixela de prata, salvas de ouro enchem os quartos e os salões do Pompéu. Na capela, além de castiçais finamente lavrados, a riqueza e a distinção expressavam-se nas alfaias, paramentos e belos veludos carmesins que ornavam as paredes.
E, nos dias de festa, na capela ou na mesa de banquetes brilhavam os doirados das fardas dos capitães, sargentos-mores, alferes-cadetes, sobressaindo dentre todas, pelo seu fulgor, a do capitão Joaquim Antônio de Oliveira Campos, da guarda imperial do sr. D. Pedro I. Gente nobre que viesse de Ouro Preto, Sabará ou S. João Del-Rei ia infalivelmente ao Pompéu, pois todos queriam conhecer e cair nas graças dessa mulher extraordinária, cujo prestígio cada vez mais se alarga, mais se dilata, saltando as fronteiras da Província e indo até à Corte, para onde ela despacha, periodicamente, suas grandes boiadas. D. Joaquina do Pompéu era uma mulher brava, uma mulher enérgica, forte e varonil. Muita gente, por isso mesmo a tem por uma mulher má. Confundem muitos a bravura com a maldade. Dona Joaquina não foi má. Tinha um grande coração. Fazia muitas esmolas. Detestava as crueldades. Prova-o a aventura a que se arriscou, dando fuga a uns presos que estavam sendo maltratados pela escolta que os conduzia.

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Este texto encontra-se em: Coriolano Pinto Ribeiro e Jacinto Guimarães. Dona Joaquina do Pompéu. Belo Horizonte. Imprensa Oficial, 1958. p. 43-47.

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LEI N. 1.033, DE 10 DE DEZEMBRO DE 1953

Autoriza o Poder 
Executivo a doar um imóvel à União, para a instalação e um Posto Agro-Pecuário. O Povo do Estado de Minas Gerais, por
seus representantes, decretou e eu, em seu nome, sanciono a seguinte lei:

Art. 1º. – Fica o Poder Executivo autorizado a doar à União a “Fazenda do Pompéu Velho”, de propriedade do Estado, com área aproximada de 212 hectares, bem como o sítio que constitui o “antigo solar de D. Joaquina do Pompéu”.

Parágrafo único – A presente doação destina-se à instalação de um Posto Agro-Pecuário.

Art. 2º. – Revogam-se as disposições em contrário, entrando esta lei em vigor na data de sua publicação. Mando, portanto, a todas as autoridades, a quem o conhecimento e execução desta lei pertencer, que a cumpram e façam cumprir, tão inteiramente como nela se contém.

Dada no Palácio da Liberdade, Belo Horizonte, 10 de dezembro de 1953.

JUSCELINO KUBISTCHEK DE OLIVEIRA

Odilon Behrens

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