sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Crônicas da terra lusitana - Lisboa - A Praça do Comércio (Terreiro do Paço)



Um dos mais belos locais de Lisboa é a Praça do Comércio, antigamente conhecida como Terreiro do Paço. É uma das maiores praças do mundo, junto ao Rio Tejo, cujas dimensões são impressionantes: 36.000 m2 (180m X 200m). Junto ao rio há um embarcadouro para pequenas naus e que também é utilizado para a recepção de chefes de estado e grandes autoridades quando desembarcam em Lisboa (assim foi com a recepção à rainha Elizabeth II). É a continuidade da Baixa Pombalina dando acesso direto à Rua Augusta e às ruas Aurea e da Prata, e cortada pela Rua do Arsenal, do lado esquerdo, e Rua da Alfândega, do lado direito. Todas com traçado linear e retangular que seguiram o projeto de alinhamento de ruas e com edifícios novos, com projetos arquitetônicos padronizados em três andares, de estilo neo-clássico, após o terremoto de Lisboa de 1755, que destruiu toda esta região. Ao seu lado encontra-se a Igreja da Conceição Velha e, diretamente na praça, desaguam duas grandes avenidas beira-rio: à direita a Avenida Infante Dom Henrique e, à esquerda, a Avenida da Ribeira das Naus. A Rua do Arsenal dá acesso ao Baixo Chiado e Parte Alta. A rua da Alfândega dá acesso a Alfama e Castelo de São Jorge. Durante a Revolução dos Cravos, de 25 de Abril de 1974, os oficiais amotinados tomaram a praça e prenderam os oficiais superiores que aí trabalhavam, dando origem ao movimento político-militar que mudou a história de Portugal e o colocou no mundo contemporâneo.
Defronte à praça encontra-se o monumental Arco Triunfal da Rua Augusta, construído em 1873/5, após a demolição do antigo, construído após o terremoto de 1755, abrindo-se para a rua de mesmo nome e dando acesso a toda a Baixa Pombalina. No topo do arco há uma inscrição dedicada à grandiosidade portuguesa quando dos descobrimentos de novas terras, povos e culturas. Assim está escrito: VIRTVTIBVS MAIORVM VT SIT OMNIBVS DOCVMENTO (“Às Virtudes dos Maiores, para que sirva a todos de ensinamento. Dedicado a expensas públicas”). No centro da praça encontra-se a estátua equestre de D. José I, construída em 1775, por Joaquim Machado de Castro. Toda a praça foi reconstruída por ordens do Marquês de Pombal após sua destruição no terremoto, sob o reinado de D. José I.
Os edifícios amarelos que circundam a praça pertencem ao governo português e até hoje sediam importantes instituições, como alguns Departamentos de Marinha. No passado, todo o setor administrativo do governo de sua majestade, desde o reinado de D. Manuel I, aí se localizava.
Hoje é ponto turístico de primeira grandeza em Lisboa. Com seus diversos restaurantes que, na primavera, verão e outono ficam repletos de mesas, cadeiras e toldos nas enormes calçadas, recebem turistas de todo o mundo, bem como de portugueses. Sob os arcos dos edifícios que fazem esquina com a Rua Augusta, podem ser encontradas feiras de artesanatos típicos portugueses. Neste período a praça recebe artistas circenses, espetáculos musicais, bandas de jazz, orquestras de câmera, conjuntos de fado e toda espécie de manifestações culturais.
Mas, nem sempre foi assim. Quando os judeus foram expulsos do território português, em 1497, pelo Rei D. Manuel I, no dia 30 de maio, uma multidão de hebreus, calculada em torno de 20 mil pessoas, se amontoava neste cais da praça para embarcar nos navios prometidos pelo rei para deixar o país. Numa manobra vil e traiçoeira, o rei proibiu os navios de se aproximar do cais e obrigou a todos os judeus a se converter à força ao catolicismo, pois, caso contrário, seriam presos ou mortos. Praticamente todos se recusaram, à exceção de sete chefes de família que se converteram. Os demais foram batizados à força, muitos puxados pelos cabelos ou barbas para que, sobre suas cabeças, se deitasse a água do batismo. O objetivo do rei era não permitir que essas pessoas, portadoras de um patrimônio financeiro, cultural, científico, tecnológico, prático nas mais diversas profissões que o reino necessitava, abandonassem o país e a nação fosse prejudicada. Nos meses anteriores a esse horror, as crianças judias haviam sido sequestradas de suas famílias e adotadas por cristãos, que as fizeram de escravas. Foram inúmeros os casos de suicídio coletivo ou individual entre os hebreus, que preferiam morrer do que abandonar sua fé e seu juramento para com as leis hebraicas. Nos anos seguintes, foram milhares de judeus que abandonaram o país. Em 1506, ocorreu outro grande pogrom (que se seguiu ao de 1499), em que turbas enfurecidas, com o ódio alimentado por religiosos, matou um número incerto de pessoas, mas que historiadores contemporâneos contabilizam entre 3 a 4 mil judeus. Em 1536, sob o reinado de D. João III, filho de D. Manuel, teve início a Inquisição em Portugal. Assim começou a derrocada do grande império português que, ao não reconhecer os direitos para a liberdade religiosa de outros crentes, afundou a nação em uma crise que durou até o século XX.


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